A Coluna por ... Hugo Alves do blog Amarcord
A educação cinéfila – breves notas
È muito comum encontrarmos uma magna disntinguo no mundo cinéfilo. De um lado teríamos o cinema entretenimento, concebido para distrair as massas e, consequentemente, desprovido de grandes conteúdos filosóficos., e, do outro, teríamos o cinema arte, que teria como fito afirmar o cinema como Arte, demonstrando a especificidade da sua linguagem e debatendo/desenvolvendo premissas filosóficas.
Cumpre salientar que sempre tive grandes reservas em aceitar esta distinção. A razão é simples: creio que é própria de uma inteligentsia digna d’ “O Nome da Rosa” de Umberto Eco. Uma inteligentsia que receia a sabedoria dos outros e, como tal, procura refugiar-se num determinado nicho, afirmando a superioridade do “seu” cinema e escarnecendo dos filmes ditos menores.
Enquanto se continuar a remeter certos autores como Bergman, Visconti, Antonioni, Goddard, Truffaut e, entre nós, Manoel de Oliveira para o rótulo de “filmes difíceis”, tal afirmação terá como principal efeito distanciar o grosso da população, matando pela raiz alguma tentativa de interesse por essas obras. Na verdade, tal atitude é – reitere-se – tipicamente medieval (compare-se com o papel da Igreja, que se arvorava defensora e guardiã do conhecimento) e visa defender uma determinada corporação, rectius, palanques de onde se pode dar asas à demonstração da erudição.
De modo a evitar o alheamento e o distanciamento da população e, acima de tudo, para aumentar a exigência do público, é mister chamar quer novos públicos ao cinema quer abrir as portas do dito Cinema Arte à população. Isto equivale a dizer que é imperioso democratizar o cinema in toto.
Para atingir esse objectivo, umas das soluções possíveis passará pela adaptação de grandes obras da literatura portuguesa em filmes. Obviamente, e como não se pode querer dar um salto maior do que a própria perna, tais adaptações teriam de ser, numa fase inicial, “ligeiras” para paulatinamente crescerem em dimensão e profundidade. Afinal de contas, julgo ser consensual que um espectador habituado a ver blockbusters terá sérias dificuldades em ver (e perceber!) Il gattopardo de Luchino Visconti…
Acresce ainda que seria conveniente criar um ciclo de reposições (veja-se o sucesso recente de Sunrise e Il Gattopardo no Nimas). Trata-se de um método de dar a conhecer a obra de grandes cineastas e, simultaneamente, abrir horizontes ao público, mostrando a história do Cinema. Acima de tudo, convém alargar as reposições a outros espaços para além da inefável Cinemateca (que, infelizmente, se confina apenas a Lisboa) e de iniciativas isoladas de algumas salas.
Ora, como o cineclubismo também já parece ter conhecido melhores dias e como a Cinemateca não pode ser transposta para todas as cidades do País, o papel principal terá de ser confiado ao serviço público televisivo. E, com isto, relembro o saudoso O filme da minha vida, programa com o qual me apaixonei pelo cinema. Porque não ter a coragem de convidar figuras públicas para falarem do filme da vida e, acto contínuo, passarem esse filme? Mais ainda, porque não ter a coragem de tomar tal atitude em pleno horário nobre?
Fico-me com estas notas esparsas e desconexas, sublinhando que enquanto vigorar uma feira das vaidades, nunca teremos uma verdadeira indústria cinematográfica. Em bom rigor, este não é um problema meramente português: longe vãos os idos anos 50 e 60 onde, efectivamente, a Europa tinha uma indústria cinematográfica...
Não podemos, pois, concordar com a máxima do Príncipe de Salina quando dizia que é preciso mudar algo para que tudo fique na mesma. Bem pelo contrário, cabe-nos tentar alterar o panorama existente melhorando-o.
Bem vistas as coisas, la vie c’était l’écran, logo, enquanto apaixonados pelo cinema temos de pugnar para que este mereça a posição que merece entre nós, defendendo-o, discutindo-o e, acima de tudo, divulgando-o.
Hugo Alves
È muito comum encontrarmos uma magna disntinguo no mundo cinéfilo. De um lado teríamos o cinema entretenimento, concebido para distrair as massas e, consequentemente, desprovido de grandes conteúdos filosóficos., e, do outro, teríamos o cinema arte, que teria como fito afirmar o cinema como Arte, demonstrando a especificidade da sua linguagem e debatendo/desenvolvendo premissas filosóficas.
Cumpre salientar que sempre tive grandes reservas em aceitar esta distinção. A razão é simples: creio que é própria de uma inteligentsia digna d’ “O Nome da Rosa” de Umberto Eco. Uma inteligentsia que receia a sabedoria dos outros e, como tal, procura refugiar-se num determinado nicho, afirmando a superioridade do “seu” cinema e escarnecendo dos filmes ditos menores.
Enquanto se continuar a remeter certos autores como Bergman, Visconti, Antonioni, Goddard, Truffaut e, entre nós, Manoel de Oliveira para o rótulo de “filmes difíceis”, tal afirmação terá como principal efeito distanciar o grosso da população, matando pela raiz alguma tentativa de interesse por essas obras. Na verdade, tal atitude é – reitere-se – tipicamente medieval (compare-se com o papel da Igreja, que se arvorava defensora e guardiã do conhecimento) e visa defender uma determinada corporação, rectius, palanques de onde se pode dar asas à demonstração da erudição.
De modo a evitar o alheamento e o distanciamento da população e, acima de tudo, para aumentar a exigência do público, é mister chamar quer novos públicos ao cinema quer abrir as portas do dito Cinema Arte à população. Isto equivale a dizer que é imperioso democratizar o cinema in toto.
Para atingir esse objectivo, umas das soluções possíveis passará pela adaptação de grandes obras da literatura portuguesa em filmes. Obviamente, e como não se pode querer dar um salto maior do que a própria perna, tais adaptações teriam de ser, numa fase inicial, “ligeiras” para paulatinamente crescerem em dimensão e profundidade. Afinal de contas, julgo ser consensual que um espectador habituado a ver blockbusters terá sérias dificuldades em ver (e perceber!) Il gattopardo de Luchino Visconti…
Acresce ainda que seria conveniente criar um ciclo de reposições (veja-se o sucesso recente de Sunrise e Il Gattopardo no Nimas). Trata-se de um método de dar a conhecer a obra de grandes cineastas e, simultaneamente, abrir horizontes ao público, mostrando a história do Cinema. Acima de tudo, convém alargar as reposições a outros espaços para além da inefável Cinemateca (que, infelizmente, se confina apenas a Lisboa) e de iniciativas isoladas de algumas salas.
Ora, como o cineclubismo também já parece ter conhecido melhores dias e como a Cinemateca não pode ser transposta para todas as cidades do País, o papel principal terá de ser confiado ao serviço público televisivo. E, com isto, relembro o saudoso O filme da minha vida, programa com o qual me apaixonei pelo cinema. Porque não ter a coragem de convidar figuras públicas para falarem do filme da vida e, acto contínuo, passarem esse filme? Mais ainda, porque não ter a coragem de tomar tal atitude em pleno horário nobre?
Fico-me com estas notas esparsas e desconexas, sublinhando que enquanto vigorar uma feira das vaidades, nunca teremos uma verdadeira indústria cinematográfica. Em bom rigor, este não é um problema meramente português: longe vãos os idos anos 50 e 60 onde, efectivamente, a Europa tinha uma indústria cinematográfica...
Não podemos, pois, concordar com a máxima do Príncipe de Salina quando dizia que é preciso mudar algo para que tudo fique na mesma. Bem pelo contrário, cabe-nos tentar alterar o panorama existente melhorando-o.
Bem vistas as coisas, la vie c’était l’écran, logo, enquanto apaixonados pelo cinema temos de pugnar para que este mereça a posição que merece entre nós, defendendo-o, discutindo-o e, acima de tudo, divulgando-o.
Hugo Alves
.
-----------------------------
Nota do editor: Será publicado mensalmente um texto de autoria de Hugo Alves para o Blogblogblog. Muito obrigado a Hugo Alves pela sua colaboração.
2 Comments:
Queria só acrescentar á ideia do Hugo de ser feita a adaptação de grandes obras da literatura portuguesa em filmes a ideia de utilizar a História de Portugal.
São imensas as histórias de amor, de guerra, de glória, de paz, de valentia, de nobreza, de... enfim... tudo. Tantos heróis por filmar.
Provavelmente pequei por alguma violência verbal...mea culpa. Mas tal deve-se a reacção de muitas das pessoas a quem fui mostrando que há mais mundos para além do Blockbuster hollywoodiano. Regra geral, a primeira reacção é má...Afinal de contas Visconti, Godard ou Bergman não primam por uma linguagem fácil e directa...
...ou isso, ou a "amostra" (salvo seja, obviamente!) não era das melhores.
Quanto ao problema da rotulagem dos filmes, creio, em definitivo, que é forçoso promover e divulgar o cinema. Iniciativas como aquela que ocorreu na Faculdade de Arquitectura (à qual, por motivos profissionais, não pude ir)são de aplaudir, cabendo-nos tentar multiplicá-las.
Outro excelente exemplo: o ciclo "Sonhos e Visões" na FCSH da UNL. Pena é que sejam iniciativas citadinas, mormente, lisboetas. Daí a necessidade de, no presente momento, o serviço público de TV ter de liderar o processo de divulgação do cinema. Se repusessem o saudoso ciclo "Cinco noites, cinco filmes" na 2 já não seria mau...
Saudações cinéfilas!
Enviar um comentário
<< Home